Cerejas Com Morangos





domingo, 23 de janeiro de 2011

A Morte como conselheira

Estou lendo um livro de Bioética que me faz refletir muito. Peguei este livro para ler por curiosidade mesmo, ou não ( rs ) .
Bioética (bio=vida e ethos= moral ou morada) ou seja, a bioética trata de assuntos ligados à ética e a vida (óbvio) . São discutidos assuntos como o aborto, o suicídio, a eutanásia, transplantes, clonagem, morte e processo de morte e os impactos que futuramente poderemos sofrer com a liberação desses processos .Não sabemos! São assuntos complexos e em diversas vezes percebi como o ser humano quer brincar de ser Deus.
Em uma das discussões sobre clonagem , um autor ainda teve a capacidade de citar uma "suposta nova versão da Bíblia" citando Genêsis " No sétimo dia, Deus descansou, após ter criado o mundo; no oitavo , o homem toma conta das coisas e se reprograma a si mesmo".
Isso é assustador e muito perigoso!
Os avanços tecnológicos e a biotecnologia são importantes para o desenvolvimento humano, devem existir, mas sua função é unicamente servir o homem e JAMAIS vice versa.
A bioética faz isso. Ela discute quais impactos esses processos podem vir a ter e suas causas nocivas.
Mas não quero discutir sobre bioética hoje não.
Quero colocar uma crônica que li no final de um capítulo que dizia sobre a morte e o processo de morrer.
Confesso que quando eu estava lendo sobre esse assunto, estava meio deprimida, reclamona e um pouco pra baixo.
Li esta crônica . chorei muito e fiquei pensando .
Quero dividir com vocês!
Bom domingo, boa semana e um abraço beeeeeeem forte!

" A MORTE COMO CONSELHEIRA"

Não, a morte não é algo que nos espera no fim. É companheira silenciosa que fala com voz branda, sem querer nos aterrorizar, dizendo sempre a verdade e convidando à sabedoria do viver.
A branda fala da morte não nos aterroriza por nos falar da morte. Ela nos aterroriza por falar da Vida. Na verdade, a morte nunca fala sobre si mesma. Ela sempre nos fala sobre aquilo que estamos fazendo com a própria vida, as perdas, os sonhos que não sonhamos, os riscos que não tomamos (por medo), os suicídios lentos que perpetramos.
Embora a gente não saiba, a morte fala com voz de poeta. Porque é nele que as duas, a Vida e a Morte encontram-se reconciliadas. conversam uma com a outra e desta conversa surge a beleza. Agora, o que a beleza não suporta é o falatório, a correria...Ela nos convida a contemplar a nossa própria verdade. E o que ela nos diz é simplesmente isso : " Veja a vida. Não há tempo para perder. É preciso viver agora! Não se pode deixar o amor para depois."
É só isto que nos dá coragem para arrebentar a mortalha com que os desejos dos outros nos enrolam e mumificam.
A morte tem o poder de colocar todas as coisas nos seus devidos lugares. Longe do seu olhar, somos prisioneiros do olhar dos outros, e caímos na armadilha dos seus desejos. Deixamos de ser o que somos para ser o que os outros desejam que sejamos. Diante da morte tudo se torna repentinamente puro. Não há lugar para mentiras. E a gente então se defronta com a verdade, aquilo que REALMENTE importa. Para ter acesso à nossa verdade. para ouvir de novo a voz do nosso real desejo mais profundo, é preciso tornar-se um discípulo da morte. Pois ela nos dá lições de vida se a acolhemos como amiga. A morte é nossa eterna companheira. Ela se encontra sempre à nossa esquerda ao alcance do braço. Ela nos olha sempre até o dia em que nos toca. Como é possível alguém sentir-se importante sabendo que a morte o contempla? O que você deve fazer ao se sentir impaciente com alguma coisa, é voltar-se para a esquerda e pedir que a sua morte o aconselhe. Estamos cheios de lixo! E a morte é a única conselheira que temos. Sempre que você se sentir , como acontece sempre que tudo está indo de mal a pior e que você se encontra a ponto de ser aniquilado, volte-se para a sua morte e lhe pergunte se isso é verdade. Sua morte lhe dirá que você está errado, que nada realmente importa fora do seu toque. Ela lhe dirá : " ainda não te toquei." Alguém tem que mudar e depressa. Alguém tem que aprender que a morte é caçadora e que ela sempre se encontra à nossa esquerda. Alguém tem que pedir o conselho da morte e abandonar a maldita mesquinharia que pertence aos homens que vivem suas vidas como se a morte nunca fosse bater no seu ombro.
Houve um tempo em que o nosso poder perante a morte era muito pequeno. E por isso, os homens e mulheres dedicavam-se a ouvir sua voz e podiam tornar-se sábios na arte do viver. Hoje, nosso poder aumentou e a morte foi definida como inimiga a ser derrotada, fomos possuídos pela fantasia onipotente de nos livrarmos do seu toque. Com isso, nos tornamos surdos às lições que ela pode nos ensinar. E nos encontramos no perigo de que, quantos mais poderosos formos perante ela ( inutilmente, porque só podemos adiar...), mais tolos nos tornamos na arte do viver. E quando isso acontece, a morte que poderia ser conselheira sábia transforma-se em inimiga que nos devora por detrás.
Precisamos ser discípulos da morte e não inimigos, precisamos abir espaço em nossas vidas para ouvir sua voz.

(Rubem A. Alvez- A morte como conselheira)

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